terça-feira, abril 26, 2005

Abril

De um passado distante erguem-se os progenitores em reclamado reconhecimento. Apenas pedem o olhar atento de quem lhes deve a vida para uma liberdade em tempos perdida agora presente. Embevecidos humildes pedidos de apreciação de atmosfera purificada de imposta restrição passada onde esvoaçante andorinha errante saboreou seu mergulho marinho em refrescado suado cansaço da luta pelo abraço a cada pedaço de momento vivido. Na memória da prole dos guerreiros sonhadores desvanecem-se agora os princípios construtores pelos quais os jovens ancestrais deram fogo em brasa de si queimando as opressões esfumaçadas em canções de fraterna união num festim de liberdade. Em ambos quaisquer os casos toleram-se quaisquer atrasos pois quem chegou em bonança nunca perdeu a esperança por algo nunca sentido. Mudam-se os tempos mudam-se as cidades e as verdades proferidas por minúsculos habitantes que caminham ofegantes em direcção ao destino que quando for atingido após pausa prolongada uma nova decisão gerará uma outra acção delinear outro caminho.

segunda-feira, abril 18, 2005

corpos no espaço

O espaço circundante que se ocupa de corpos estranhos ao nosso fala amordaçado por murmúrios levemente perceptíveis. Trejeitos de faces felizes comunicam em fundo de sons que colidem em estridente azáfama de manada à solta, pululam membros que descrevem rotas precisas constringidas pelas forças dos outros que os movem na floresta de gente, onde o toque quente de faúlha em brasa encosta roçado por asa e o sorriso esboçado por testa franzida em rosto cansado disfarça contida alegria presente. O espaço ocupante que circunda os corpos balbucia num ritmo próprio as suas cores diversas pintadas em telas onde pàletes de movimentos fluidos coloridos geram situações de arco-íris de próxima distância, onde o desejo guloso espreita de seu reduto aninhado e embasbacado fita o longínquo horizonte onde jazem as naus naufragadas, embarcadas demandas à séculos sonhadas de riscos tomados por estradas de sal temperadas com ocasionais intempérides. Basta de bastardos definhados de olhares esgazeados que em sua desarticulada dinâmica estática poluem e encravam a sequência natural de eventos unificantes que untam as partes colaborantes de amor. Em paz o grupo atento tece a cola que une cimento que os funde na mola que os projecta a um estado maior de ascenção de síncrona sintonia afinada onde cada parcela vê-se articulada e reconhece o encaixe da plenitude do seu meio vital.

quinta-feira, abril 07, 2005

perda

A perda é um microcosmos dorido alojado no fundo sentido da cratera de um projéctil enviado no premir de botão por dedo de quem se ama. Dos risos soltos em dias de primavera lufadas de borboletas pousadas em pétalas saboreiam néctar em bucólico deleite a nudez escorre como leite colina abaixo de braços abertos movimentos certos rola na relva e pasta a frescura que paira no prado. Resta apenas enfeite postiço de máscara de gente cravada no rosto de tom indiferente em corpo colhido por foice afiada: onde está a estrada de simplicidade luminosa em seu portento de luz? Porque deambula a negra solidão de capa preta e capuz pelo obscuro bosque de carvalhos anciãos que ladeiam a berma? Liquefaz-se a dôr e bebe-se de um só trago, amargo travo a tristeza em fineza de boca que sufoca distraída, caída palavra no chão estatela-se de um só estalo.

segunda-feira, abril 04, 2005

o nó

Enrolar o cabelo num ritual refinado de lânguidos movimentos circulares que convergem na elaboração de um pequeno nó. O prazer culmina no instante preciso da concisa dissolução do nó, despoletar de êxtase onde preponderante algo de mais excitante, explode a nua tensão num despejo fluido de um acontece e o Universo resplandece em toda a sua densa congruência unitária. Ambivalência binária de dualismo assumido, reflexão redundante de tanto tempo perdido, o nó compõe o todo como componente integrante da globalidade pensada e sem ele nada faria sentido.

domingo, abril 03, 2005


amanhecer

Desponta ao longe um sol pálido mas força de vigor espelhada nos olhos. Hoje tudo mudou. Hoje impera a leveza a solidez do granito apodera-se do corpo mole e a mente flácida abre o peito cerra os dentes e ergue-se das cinzas fénix indestrutível imparável dirigível em rota de colisão. Nada nem ninguém a mal ou a bem impedirá o ímpeto da poderosa cascata dura que rasga a rocha bruta em forçada erosão e perscruta em minúncia a Terra. Esta guerra não é nova, é o velho caminho gasto pelas solas transeuntes de quem sabe da efemeridade da preciosa viagem.

sábado, abril 02, 2005

poesia

Poesia como dança mental organizada de acordo com um padrão individual de expressividade. O livre exercício de palavras que fluem soltas e se riem despreocupadas com a sintaxe imprópria na qual por vezes tropeça quem não olha para o chão. Não, o sentimento inexpressável pode ser liberto da sua tumba silenciosa de uma forma subjectiva e amplamente abrangedora: uma multiplicidade de aspectos pessoais intrinsecos não partilhados derivados de um vivência irrepetível corroem os andaimes que sustentam a precária edificação sináptica que apática desaba sob o fardo de um peso amado. Torna-se imprescindível agir no sentido de transmutar tralha em palavras de prata.

embalo

colapso

Eis que um dia o desabar inevitável de uma estrutura interna imperfeita ribomba pelos desfiladeiros estéreis de um deserto perdido nas dunas. Rasteja na poça de uma sargeta imunda a outrora brilhante forma, dos tempos esquecidos da ascenção, quando o amor transbordava dos homens e enchia barragens de felicidade. Agora o núcleo interno de um cerne formado em fecho cerrado colapsa sob o peso do próprio vazio, o nada imiscui-se nas finas reentrâncias de entranhas mentais microfracturadas vazadas de um propósito maior, e o vácuo, esse, insinua-se em amável subtileza e convida a beleza da presença de uma ausência para tomar chá.

extravasamentos

Extravasar é preciso. O que faz falta é animar a mente descrente que a si própria mente, desvendar o emaranhado intrincado de uma densidade complexa que se anexa a uma rápida modificação na percepção do mundo que nos rodeia, desembrulhar a sós os nós que a nós nos frustram, quebrar a corrente da pesada carga carregada pelos carreiros das montanhas do tempo.